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sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Ninguém é de ninguém?

Ivan Martins
 Nos últimos anos, eu tenho tido com amigos e amigas cada vez mais conversas sobre conduta sexual. As pessoas estão inseguras sobre o que podem e o que não podem fazer. Querem discutir o seu próprio comportamento e o comportamento dos outros. Por trás disso, há confusão e dor.
Um exemplo: uma amiga me perguntou, uma vez, se eu achava normal que o fulano que dormiu com ela na sexta-feira a convidasse, no sábado, para uma festa em que ele estaria com a namorada. Outro exemplo: a moça está em dúvida entre o fulano e o sicrano e, durante um tempo, alterna entre os dois. Pode? Ou ainda: se você está começando a sair com a ex-mulher de um amigo, qual é a hora de conversar com ele sobre isso? Aliás, você deveria ou não deveria sair com a ex-mulher do seu amigo?
Nada disso parece dramático, mas eu posso atestar que questões como essas têm causado estresse entre as pessoas à minha volta.
Num mundo em que as regras de relacionamento e a etiqueta social deixaram de ser claras, as pessoas não sabem mais o que é correto e o que deixou de ser. Frequentemente não sabem o que se espera delas e o que elas podem esperar das outras pessoas. E, muitas vezes, homens e mulheres sofrem porque seus sentimentos não são compatíveis com as liberdades que as circunstâncias oferecem.
No meio dessa confusão, eu sou capaz de perceber três tipos de moral ou éticas de conduta, ao menos entre os homens.


A primeira é tradicional e restritiva: eu me comporto de maneira monogâmica em relação a minha parceira e não avanço sobre as parceiras dos demais, sobretudo dos amigos. A gente sabe que esse arranjo permite exceções (clandestinas) e demanda mentiras eventuais, mas ele funciona na maior parte do tempo, para a maior parte das pessoas.
A segunda moral é permissiva. Posso me relacionar livremente com outras pessoas, permito que a minha parceira se relacione com quem ela quiser e não reconheço regras territoriais ao meu redor. É o ninguém é de ninguém. Pouca gente tem coragem de viver assim, mas acontece com alguns casais.
O terceiro tipo de moral raramente se declara, mas existe: é a do predador oportunista. Ele se relaciona com todas as mulheres que puder, mas não gosta que a parceira dele faça o mesmo. Em relação aos outros homens, a regra também é clara: ele não respeita território, mas fica nervoso se o seu território é ameaçado. Quando esse tipo de comportamento é bem sucedido, tende a formar ao redor do macho oportunista uma espécie de harém que ele, zelosamente, trabalha para manter e ampliar.
Como a vida nem sempre é simples, e como as pessoas tendem a ser contraditórias, é comum que um sujeito que acredita num tipo de atitude acabe praticando outra. Ou que as pessoas se sintam forçadas a aceitar dos parceiros comportamentos que elas mesmas não teriam.
Não é raro, por exemplo, ver mulheres possessivas tolerarem atitudes predatórias de homens por quem estão apaixonadas. E já vi mulheres conservadoras se portarem de forma libertina para agradar ao parceiro. Os homens são menos flexíveis quando o comportamento da parceira provoca neles algum tipo de dor ou constrangimento. Historicamente, a nossa tolerância é pequena com a transgressão do outro e grande com as nossas próprias transgressões. Mas mesmo homens conservadores têm vivido coisas que antigamente não seriam toleradas. Ninguém passa impune pela revisão dos valores.
Onde isso nos deixa? Eu não tenho certeza, mas nas conversas e no convívio percebo algumas coisas, contraditórias.
A primeira é uma vontade de agir livremente, com base apenas nos próprios desejos e sensações. Esse é um impulso antigo que a sociedade moderna alimenta e reforça. Seja você mesmo, faça o que quiser, viva como quiser. Em termos sexuais e afetivos, equivale a “transe com quem quiser, se relacione com quem quiser, experimente e seja feliz”. Há uma festa acontecendo por aí, ela não tem hora para acabar e você está definitivamente convidado. Essa é a parte boa da sensação (que tem, inegavelmente, um gosto de adolescência estendida. É como se a gente, coletivamente, se recusasse a sair do período de incubação emocional e experimentação. Todo mundo fica com todo mundo, todo mundo se ama e se odeia e é feliz. Esse é um comportamento adolescente que cada vez mais permeia a vida adulta – aos 20, aos 30, aos 40...)
A segunda coisa que eu percebo é que as pessoas estão com medo. Se você entra no mundo da liberdade é obrigado a fazer concessões. A sua segurança é testada o tempo inteiro. O terreno se torna movediço. Se você faz o que quer, todo mundo acabará fazendo igual. Se as restrições foram suspensas, alguém vai invadir seu território, sua mulher vai se envolver com outro homem, seu amigo (que horror) vai sair com a sua ex-mulher. Você vai experimentar o lado B da permissividade e vai doer. É preciso ser forte e desprendido para viver assim, sem garantias e sem a proteção das convenções.
O economista Roberto Campos, já morto, costumava dizer que no mundo ideal todas as mulheres são solteiras e todos os homens são casados, menos eu. Obviamente esse mundo não existe. Quem entra na chuva se molha. Quem olha da janela passa vontade, mas está seco. Há que escolher.
Então, onde isso nos deixa? Minhas conclusões:
1) cada um de nós tem de descobrir a que tipo de mundo pertence: se você gosta de sossego, não é boa ideia viver perigosamente.
2) é preciso encontrar o parceiro ideal: espíritos livres não podem estar amarrados a pessoas convencionais. Ache a metade da sua laranja e tente ser feliz.
3) lamentavelmente, não existe segurança absoluta. Qualquer que seja a sua escolha, qualquer que seja parceiro ou parceira, o mundo não é um lugar afetivamente seguro ou sexualmente impenetrável.
4) todos os arranjos são provisórios e perecíveis. Logo, viva a sua relação como se ela fosse acabar amanhã. Às vezes acaba.

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