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sábado, 7 de novembro de 2009

Adeus, obesidade

A obesidade é uma doença crônica e epidêmica – atinge 11% da população adulta brasileira, segundo dados do Ministério da Saúde. Mesmo que consiga emagrecer, a pessoa terá de passar o resto da vida cuidando da alimentação e de olho na balança. Não é fácil para um obeso tomar a decisão de perder peso. Como o tratamento de qualquer compulsão, é necessário acompanhamento psicológico, além de uma equipe interdisciplinar de médicos, já que o corpo inteiro é afetado pelo peso exagerado. As doenças que acompanham o quadro de obesidade são hipertensão, diabetes, má circulação, sobrecarga de todo o organismo, irritabilidade, depressão e outros distúrbios psicológicos. Confira, abaixo, histórias de pessoas que encararam o problema de frente, combateram-no e hoje se sentem muito mais seguras e felizes. A antropóloga Sílvia Regiani e o vendedor Cid Loureiro carregam a bandeira contra a discriminação de obesos e dão apoio aos brasileiros que sofrem da mesma doença.


Sílvia M. Bonini Regiani é antropóloga e autora do livro Mulhersegura.com, que já está na segunda edição. O site do livro recebe 3 milhões de acessos por mês
“Emagreci 102 quilos em quatro anos. Obesidade mata e todo mundo acaba recorrendo ao método mais rápido, que é a cirurgia de redução de estômago. E, no caso das mulheres, é mais difícil emagrecer porque o metabolismo é mais lento. Mas eu tive que quebrar essa barreira. E tomei essa decisão porque não queria mais ser discriminada.

 Divulgação
Silvia, no auge de sua obesidade (à esq.), quando pouco se deixava fotografar e hoje, com um sorriso de verdadeira felicidade e segurança no rosto
Venho de uma família boa de mesa, mas ninguém me mandava comer quatro pratos numa única refeição – quem passou dos limites fui eu. Em 2003 eu estava com 180 quilos, em estado de coma do diabetes e ainda tinha hipotiroidismo. No meu caso, comer significava morrer. Eu não tinha outra saída a não ser me reeducar. Primeiro, pensei em fazer cirurgia, mas o médico disse que não podia me operar porque meu organismo não ia aguentar. Ele me deu de quatro a seis meses de vida. Eu tinha só 27 anos. Comi a vida inteira e iria morrer por causa disso?

No fundo, eu sabia que ele estava certo. Não caminhava uma quadra sem ficar ofegante, tinha problema para abaixar e amarrar o sapato, irritabilidade, dor de cabeça... Até eu entender o que estava acontecendo, demorou muito tempo. O obeso não é feliz. Ele come sentimento, não comida. A obesidade é uma droga.

Eu, que comia dois quilos de comida no almoço, uma pizza gigante e dois litros de refrigerante no jantar, voltei para casa pensando se ia me matar ou me tratar. Mas não queria me tratar. “Como vou me tratar se a única coisa que me restou é comer?”, eu pensava. Desde pequena sou obesa, agressiva e ninguém nunca parou para me escutar – por isso, vivia me defendendo. Eu pensei em três maneiras de me matar, uma delas era ir ao supermercado, fazer o último jantar e tomar veneno. Comprei uma latinha de Neocid, um veneno de pulga. Tomei tudo e não aconteceu nada. Dormi muito e acordei que nem uma santa. Acordei ótima – fazia tempo que não dormia tão bem porque sofria de insônia e síndrome do pânico. Então resolvi criar vergonha e me tratar.

Aos 21 anos tive câncer de mama, causado pela obesidade. Há três anos, tive um AVC (acidente vascular cerebral) e perdi 75% da visão do olho esquerdo. Em que Sílvia eu havia me transformado, quem eu era? Eu precisava buscar essa resposta e tinha que pôr o dedo na ferida para vencer a doença. Quando fui ao endocrinologista, ele me montou um cardápio de 1200 calorias diárias. No começo não foi fácil. Eu fazia meu prato, sentava, rezava e começava a chorar. Isso durou nove meses. Comecei a caminhar 250 metros de manhã porque não aguentava mais do que isso. Hoje percorro diariamente 8 quilômetros entre caminhada e corrida. Depois de um mês, tinha emagrecido cinco quilos. Os primeiros 13 foram por causa do remédio para a tireóide. Depois, só no regime. Entrei para a natação e comecei a praticar dança flamenca. Hoje estou com 67 quilos, 1,81 metro e 33 anos. Devo chegar a 64 quilos porque, se engordar 10, não ficarei ruim. Se chegar aos 80, posso voltar a me descontrolar.

No meio do tratamento você fracassa, erra... Percebi que eu mesma tinha feito isso comigo. Mas consegui provar que, com atividade física, endocrinologista, psiquiatra e sem remédio é possível. E além de tudo, produzo menos lixo. Passei a ter relações sociais. Antes, eu me escondia, quando não agredia alguém. Meu amor por mim me salvou. Se hoje meus órgãos funcionam bem, é lógico que terei uma estética bonita. Antes, eu me escondia da vaidade. Hoje, sempre tenho um sorriso no rosto.”
 
Cid Loureiro Penteado Júnior é vendedor e autor do site www.exgordo.com.br, que recebe cerca de 200 visitas por dia
“Sempre fui uma criança gordinha. Aos 14 anos, fiz meu primeiro regime e assim eu entrei no hall dos obesos "sanfona". Fiz várias dietas famosas: a de Beverly Hills, Emagreça comendo, todas as dietas da Lua, do Sol, do Arroz, do Bichinho do Amendoim etc, etc, etc... E com cada uma delas eu emagrecia e depois engordava novamente.

 Divulgação
Cid Loureiro: a obesidade mórbida (à esq.) foi embora, mas ele ainda controla a alimentação e pratica exercícios (à dir.)
Em 1992, quando me casei, aos 23 anos, estava pesando algo em torno de 150 quilos. Devido a problemas financeiros e muito estresse, relaxei e me deixei levar pela compulsão. Comia o dia inteiro e não escolhia os alimentos. Sorvetes e doces à vontade. Massas e churrasco quase diariamente. Apesar da velocidade com que ganhava peso, só percebi quando estava com mais de 200 quilos. Desesperado, errei novamente, ao procurar mais um médico que prometia milagres, e mais uma vez entrei na “bolinha” (anfetamina). Emagreci um pouco e, depois de abandonar o tratamento, cheguei aos 290 quilos.

Já não tinha mais autoestima. Meu único prazer era comer. Não era possível ter uma vida normal. Andava com dificuldade, minha higiene íntima era precária e minha vida sexual, uma droga. Provavelmente, aliado a todos esses problemas, eu devia ter entrado numa depressão que possivelmente me levaria à morte. Apesar de todo amor e carinho com que minha esposa e família me tratavam, eu não me animava, e emagrecer era um sonho impossível. Nessa época, para ajudar na degradação do meu organismo, fumava 2 maços de cigarro por dia.

Tinha depressão por me sentir culpado porque nada funcionava – me sentia responsável por aquela situação, me achando fraco e incapaz de lidar com minha própria condição. Isso me deprimia mais e mais. Até que fui parar no hospital com 300 quilos, problemas vasculares, hipertensão e diabetes. Foi quando os especialistas me esclareceram que eu não era culpado, mas vítima da obesidade. Tive que fazer tratamento para controlar a compulsão e emagrecer 40 quilos antes da cirurgia. Se o paciente não trata da compulsão, há o risco de desenvolver outras compulsões depois, com compras, jogos ou álcool.

Operei em março de 2000, com 30 anos. Emagreci durante três anos e agora estou com 120 quilos, tenho 1,90 metro de altura e 20 quilos só de pele. Precisarei fazer sete plásticas para tirar essas sobras. Tento levar uma vida saudável para não engordar. Brinco que a minha vida é tão normal que até regime eu tenho que fazer!

A adaptação após a cirurgia causa um medo muito grande, porque você tem de enfrentar a vida sem a presença da comida. Você deixa de ter um estômago com um volume de dois litros para um de 30 mililitros. Durante um tempo eu não conseguia me enxergar magro, continuava me sentindo discriminado. No primeiro, segundo ano, as pessoas me viam e não me reconheciam – perdi minha identidade. Por isso o acompanhamento psicológico é essencial.

A cirurgia mudou a vida da minha família inteira. Éramos todos obesos e por uma questão de conscientização todos acabaram emagrecendo. A minha mulher também era obesa e começou a praticar atividade física comigo. Hoje é professora de educação física e ciclista profissional.

Obesos tentam manter o bom humor e chamar atenção pela simpatia, mas sofrem muita discriminação, principalmente na televisão, em programas humorísticos. Não se fala mal dos negros, de pessoas com câncer, lepra ou HIV. Mas há quadros humorísticos inteiros discriminando obesos e o próprio obeso se coloca naquela posição. Eu fundei a ONG Contra Peso Brasil, em 2005, para tentar mobilizar a sociedade contra esse tipo de preconceito. Isso não quer dizer que a sociedade tenha que se adaptar ao obeso. Se você cria condições para o obeso viver confortavelmente, provavelmente ele vai piorar e aumentar ainda mais seu peso. Tem que investir em piscinas, pistas de corrida e academias. Fazer o comerciante mudar a estrutura de seu estabelecimento – colocando assentos especiais para obesos, por exemplo – só favorece o aumento da doença.“

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